Eu tive medo.
Tive medo de um dia não ter do que lembrar, de não ter
história pra contar, nem de um amigo antigo pra abraçar.
Tive medo de não ter sofrido por amor, de não ter morrido de
ódio do absurdo, ou de não ter acreditado cegamente que tudo daria certo.
Tive medo de não ser capaz de me doar, de não ser igual e de
não fazer parte da festa final.
Tive medo de não ser como a minha mãe, de parecer demais com
o meu pai e de não ter abrigo pra voltar.
Tive medo de ser rebelde demais, de ser alheia demais e me
faltar.
Tive medo de não ter caminhos, de errar escolhas, de cair e não
levantar.
Tive medo de depressão, de câncer, de ser firme e de ter certeza
do fim.
Tive medo de não poder me soltar, de ser certo demais, de
ser errado de menos e de dançar.
Tive medo de gostar de outra coisa, de ser feliz sem
precisar, de rir na hora errada e de não rir nunca mais.
Tive medo de sentir vergonha de mim e de não conseguir
aguentar.
Tive medo de sair sozinha e de ter compania pra toda vida.
Tive medo de dar o primeiro passo, de dar uma abraço
apertado e de pedir desculpas sem culpa.
Tive medo de ser injusta e de ser justa a ponto de não saber
ponderar.
Hoje tenho medo ainda de quase tudo e de ficar muda sem poder
brigar.
Tenho tanto medo do futuro e por também ter medo de um dia
não ter medo, continuo.